sábado, 15 de outubro de 2011

Para ser um Professor!...



Em sua "Ética à Nicômaco", Aristóteles ensina que o verdadeiro cidadão é aquele que tem conhecimento das virtudes capazes de orientar a ação para o bem. Todavia, antes dele, seu velho mestre, qual seja, Platão, já dizia que, para que naçam cidadão virtuosos, é preciso propiciar uma educação centrada em princípios fundamentais de modo a garantir a efetivação das leis. Na Idade Media, a Filsofia da Educação é quase que sinônimo de formação (erudita), a despeito de se considerar ainda o homem na sua integralidade.
No Humanismo e no Renasicmento essa unidade do homem, em termos de suas capacidades (físicas e cognoscitivas, éticas e morais) são levadas em consideração no que respeita à busca de um lugar para o humano no quadro geral da physis. Entretanto, pode-se mesmo afirmar que é com a separação/distinção entre a vida política (exercício do poder) e a práxis (moral), levada a efeito por Maquiavel, que educação começa a se instrumentalizar e o professor se torna apenas reprodutor de conteúdos ditados pelas disposições de governos, á luz de seus interesses de dominação/subjetivação.
Talvez esta hipótese seja preciptada demais; porém, deve-se considerar que Rousseau e Kant, defendem, respectivamente, uma educação pensada como formação humana para o exercício da cidadania e da moralidade, compreendida como respeito inegociável à dignidade de toda e qualquer pessoa - bandeira de luta dos chamados Direitos Humanos (de Terceira Geração).
Desta feita, a educação e, conseguintemente, a prática pedagógico-educativa, segundo uma possível hermenêutica do assunto em vista da teoria marxista, deve constribuir para a desideologização, desalienação e, finalmente, para a emancipação do homeme das amarras da dominação capitalística e dos preconceitos que graçam o dia-a-dia de quem, por exemplo, é vítima de violência e agressão (física, simbólica, psicológica, emocional) por ser mulher, negro/a, homossexual, enfim...
Para finalizar, gostaria de me utilizar de uma metáfora que foi cunhada pelo Jurisfilósofo (Filósofo do Direito) Ronald Dworkin, para quem os juízes são verdadeiros "Hércules" quando, diante de casos difíceis, tem que, apoditicamente, decidir, porquanto está em suas mãos um poder/dever discricionário que os obriga a sentenciar... Nós, professores, somos verdadeiros heróis, pois temos sempre que nos decidir a permanecer/continuar/insistir na carreira e na vida docente por amor à profissão... Feliz Dia dos Professores!

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Para uma nova história da loucura...

Estava cá a folga, quando, não mais que de repente, ocorreu-me que na história da moralidade uma das preocupações mais fundamentais é, precisamente, a definição do "mesmo" enquanto categoria de identificação e, portanto, delimitação de noções como igualdade, liberdade e justiça. No âmbito da cultura e da racionalidade ocidental, a tensão entre o eu e o outro sempre alimentou os pilares da civilização e, também, das convicções acerca do "certo" e do "errado" que, para garantir a estabilidade mental e social de uma estrutura de poder calcada no exercício da força (seja ela física ou simbólica), legitimou as dissimetrias de raça, classe, gênero, sexo e etnia, mediante instituições supra-individuais como o Estado, a família, a religião e, também, o direito.
No interior das relações sociais, organizadas através do instituto da família e das mediações e trocas decorrentes do parentesco e, também - ou principalmente - das instâncias econômicas e políticas, o jogo retroativo, isto é, as regras de ação e reação simbólicas descritas pelo contato (intersubjetivo) entre as pessoas ocorrem à guisa do communi sensu (entendimento cumum generalizado) que estrutura, portanto, ideias referenciadas numa linguagem que tanto concebe o mundo a partir de uma visão explicativa e totalizadora do real (Weltanschauung), quanto pressupõe uma ação e, ainda, uma epistemologia comprometida com a prática habitual, reiterada e naturalizada.
É, assim então, que medicina, psiquiatria, psicologia e sexologia - ora acompanhadas pelas Ciências Sociais e, também, pelas Ciências da Educação; ora distanciadas de qualquer interface sócio-cultural - procuraram definir, biofisiologicamente o anormal, interpondo também a categoria do normal. Portanto, ao fim e ao cabo, no limite extremo da cientificidade biológica estão os conteúdos naturalizados da moral que estendem o estatuto ontológico da physis à dialética prescritica do reino humano (que é, inequivocamente, sempre histórico e circunstanciado).
Todavia, encontramo-nos em uma situação tal que somos imediatamente colocados na cultura, de maneira que não estamos livres para consubstanciarmos nossos desejos de modo absolutamente puro. O choque, ou melhor, a tensão entre o indivíduo e a sociedade propiciam as "fissuras" que marcam a cisão de um eu integralizado que a estrutura social capitura em suas regras moralistas de conduta. Ora, tais regras se nos impõem coercitivamente, até ao ponto em que as suceptibilidades mais delicadas, quais sejam, as que não se esquematizam e horientalizam passam a sofrer os efeitos de um processo de subjetivação que contrapõe aquilo que performatizamos e aquilo que fantasiamos; pois, quando as fantasias não concordam com as regras do imaginário que é comunmente acieto, emergem das entranhas do mundo da vida, um tipo específico de dasein que desliga-se do contexto antropológico das representações históricas.
Os tipos humanos que se desviam da moralidade interposta à subjetividcade como norma de conduta são, em uma palavra, infames, no sentido de que não vivenciam uma experiência compartilhada, quer porque não se submetem às predições do sistema sismbólico vigente, quer porque vivenciam suas próprias idiossincrasias a ponto de se perderem em seus sonhos ou delírios. Mas a loucura assim compreendida até pode ser encarada como uma poética do eu, apesar de romper os nexos que ligam os indivíduos uns aos outros no horizonte dos costumes.
Todavia, se existe um Dionísio que se repreduz no bárbaro e outro que "luninescende" (istó é, que vem das profundezas obscuras da existência à luz) pela via do estético - e as telas de um Munch são um exemplo -, é possível supor que a saga do "além-do-homem" na terra ainda nem tenha começado, posto que nos falta a percepção necessária para transformarmos a perversidade do conflito entre o indivíduo e a cultura numa narrativa verdadeiramente ética. Afinal, os homens desconhecem os seus prórpios fundamentos...

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Um leve toque de Sophia...





 A Escola de Atenas, de Rafael (1506-1510)


É muito comum estudantes e professores de Filosofia serem questionados acerca da natureza e dos propósitos da mesma. Se, por um lado, todos imaginam saber qual o escopo do ensino das Letras, qual a importância do ensino da Matemática, qual o caráter do ensino da Física, qual o interesse do ensino da Química, qual a necessidade do estudo da Biologia, da História e da Geografia, pouquíssimos são aqueles que reconhecem a legitimidade da Filosofia e sua verdadeira contrapartida. No entanto, antes de prosseguir, é mister observar que Filosofia não é, sobremaneira, argumento de religião – embora possa fundamentar a Teologia enquanto uma possibilidade ou tentativa de compreender lógica e racionalmente o “fenômeno” divino. Porém, diga-se, a Filosofia pensa Deus e não simplesmente o aceita. Emerge, aqui, então, uma primeira distinção: enquanto as doutrinas religiosas estruturam-se mediante a experiência (muitas vezes mística!) da fé, a Filosofia estrutura-se a partir da razão.
Nestes termos, a Filosofia constitui um campo do conhecimento e não um postulado ou corolário de dogmas que devem ser observados, sob pena do crente ou fiel ser punido, castigado ou até mesmo execrado. A diferença entre Filosofia e religião é, portanto, uma das notas preliminares que devem ser consideradas, haja vista confundirem-se a seriedade teórico-epistêmica da postura do filósofo com a austeridade ascética do cristão empedernido. Todavia, pode-se objetar este argumento contrastivo, destacando-se que, assim como a religião, a Filosofia está preocupada com as questões fundamentais da existência. Porém, deve-se advertir que, quando a racionalidade filosófica perscruta a origem (arké) e o télos (fim), ela o faz com vistas no mundo dos homens e não em um suprassensível para além das estrelas...
Pois muito que bem, se a Filosofia é conhecimento racional, qual a diferença dela em relação à Ciência que também se utiliza da racionalidade como parâmetro estruturante do saber? Ora, tanto a Filosofia, quanto a Ciência buscam as causas das coisas. Efetivamente falando, só se pode conhecer filosófica e/ou cientificamente o mundo e/ou a realidade (física ou humana/social) mediante a investigação sistemática, regular e coerente das causas. É, justamente, por isso que tanto a Filosofia, quanto a Ciência diferem do senso comum, porquanto ambas não aceitam passivamente, isto é, sem análise crítica, as superstições e preconceitos histórica e socialmente construídos. No entanto, na medida em que a Filosofia busca compreender a realidade a partir de um ponto de vista eminentemente teórico-especulativo, ela se caracteriza como um saber totalizante; ao passo que a Ciência delimita pontualmente seu objeto de estudo, investigando, a partir de métodos e técnicas (instrumentais), a realidade física (como no caso das ditas hard sciences, isto é, das chamadas “ciências duras”, tais como a Química, por exemplo) ou, ainda, a realidade humana e/ou social (cultural).
Se, como diz o adágio popular, “de médico e louco todo o mundo tem um pouco”, tenha-se plena certeza que cada um de nós, inequivocamente, é também um pouquinho de “filósofo”. Quando pretendemos “descobrir” quem somos – na acepção mais genuína do verbo ser; quando questionamos o sentido da vida; quando desconfiamos das certezas absolutas e, ainda, quando buscamos um entendimento do contexto histórico-social humano, já estamos a caminho de tudo aquilo que os grandes pensadores elaboraram. Todavia, deve-se ficar bem claro que a Filosofia não se confunde com a Psicologia e que ambas não tem nada a ver com autoajuda. Ora, a Psicologia é uma ciência que visa, mediante diversas abordagens, garantir ou restituir a integridade do indivíduo; já a Filosofia está muito mais interessada em fazer um uso teórico da razão do que propriamente promover o bem-estar psíquico. Em última instância, a Psicologia trata da subjetividade humana, ao passo que a Filosofia pergunta-se, como bem ensina Kant, “o que posso conhecer?”, “o que devo fazer?”, “o que posso esperar?” e “o que é o homem?”. Vê-se, assim, que a Filosofia difere da Psicologia e que nem uma e nem outra compactuam com a postura tacanha de “superação” de dificuldades propalada de modo vulgar pela literatura de autoajuda que graça nas estantes das livrarias que negociam verborreias infundadas como se fossem verdadeiras teorias.
Porém, de todas as confusões e impropérios que orbitam ao redor da Filosofia está o subproduto mais imediato da ignorância daqueles que desconhecem a matéria e a mediocridade daqueles que acreditam que sabem de tudo, qual seja, a ideia de que a razão filosofante confunde-se com a loucura inebriante. Ora, o questionamento incisivo e a crítica radical não devem ser confundidos com a inconsistência de um pensamento desarranjado e a incoerência de um juízo patologicamente afetado. Filosofia – repito – não é sinônimo de loucura – ao menos não necessariamente...! Mas, afinal, o que é Filosofia? Pois bem, a palavra “Filosofia” vem do grego e significa amor (filo, fila) à sabedoria (sophia). Dizia Pitágoras (570/571 a.C a 496/497 a.C) que os filósofos não são sábios, pois a sabedoria enquanto tal pertence aos deuses, de modo que aos humanos cabe apenas aspirá-la, amá-la. Nestes termos, o filósofo é o amante da sabedoria, o amigo do saber.  A Filosofia nasce no século VII a.C, entre os Jônios, na Cidade de Mileto, com Tales, desprendendo-se do interior das formulações mitopoéticas que, por sua vez, eram cantadas pelos poetas inspirados, homens tidos como sábios. Quando surge, portanto, a Filosofia opera uma verdadeira transformação na percepção total da realidade. O filósofo, ao contrário do poeta (aedo ou rapsodo), não é mais o sábio que detém o conhecimento dos sortilégios do mundo, e sim apenas um “investigador”.
No entanto, não basta dizer que a Filosofia é o “amor à sabedoria”, posto que o que caracteriza o esforço teórico do filósofo é, também, responder a esta pergunta, levando-se em conta as “aquisições” conceituais dos que o antecederam. Logo, se se disser que o filósofo busca a verdade, tem que se dispor que esta “verdade” é historicamente construída e só pode ser adquirida coletivamente. E, ainda, se se diz que verdade e realidade se confundem, é necessário, então, investigar os limites e possibilidades para o conhecimento das coisas, já que a Filosofia é um exercício racional de constante reflexão. Porém, se o filósofo deve, além de descrever as primeiras causas e os primeiros princípios que regem o conhecimento da realidade física, ele também tem que dar conta dos valores ético-morais que devem orientar a vida e a práxis política, da mesma forma que deve-se ocupar dos juízos de (bom) gosto que definem os limites entre arte e natureza.
Como diria Platão, a Filosofia é para poucos – e não adianta insistir quando não se tem uma espécie de “talento natural”. O número de filósofos no mundo, desde o surgimento da Filosofia na Grécia até os dias atuais, é infinitamente menor que a escala absoluta da população do globo. Excetuando-se, portanto, essa seleta de “livres-pensadores”, quem resta? Ora, restam apenas bons comentadores de Filosofia, professores e alunos (de Filosofia ou não), pessoas que ouviram dizer mas não conhecem, pessoas que desprezam totalmente e, ainda, pessoas que ignoram esta que é a “ciência da liberdade do espírito” – permitindo-me falar em “enigmas” como Hegel. Para concluir, se, como disse Kant, “não se aprende Filosofia, mas a Filosofar”, só tem sentido falar em um ensino de Filosofia em escolas e Faculdades se a preocupação inicial for com uma cultura da reflexão que possibilite uma atitude crítica diante das coisas do mundo e da cultura.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

A BÍBLIA E OS GAYS

Frei Beto

É no mínimo surpreendente constatar as pressões sobre o Senado para evitar a lei que criminaliza a homofobia. Sofrem de amnésia os que insistem em segregar, discriminar, satanizar e condenar os casais homoafetivos.
No tempo de Jesus, os segregados eram os pagãos, os doentes, os que exerciam determinadas atividades profissionais, como açougueiros e fiscais de renda.
Com todos esses Jesus teve uma atitude inclusiva.
Mais tarde, vitimizaram indígenas, negros, hereges e judeus. Hoje,homossexuais, muçulmanos e migrantes pobres (incluídas as "pessoas diferenciadas"...).
Relações entre pessoas do mesmo sexo ainda são ilegais em mais de 80 nações. Em alguns países islâmicos elas são punidas com castigos físicos ou pena de morte (Arabia Saudita, Irã, Emirados Árabes Unidos, Iêmen, Nigéria etc).
No 60º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 2008, 27 países-membros da União Europeia assinaram resolução à ONU pela "despenalização universal da homossexualidade".
A Igreja Católica deu um pequeno passo adiante ao incluir no seu catecismo a exigência de se evitar qualquer discriminação a homossexuais. No entanto, silenciam as autoridades eclesiásticas quando se trata de se pronunciar contra a homofobia. E, no entanto, se escutou sua discordância à decisão do STF ao aprovar o direito de união civil dos homoafetivos.
Ninguém escolhe ser homo ou heterossexual. A pessoa nasce assim. E, à luz do Evangelho, a Igreja não tem o direito de encarar ninguém como homo ou hetero, e sim como filho de Deus, chamado à comunhão com Ele e com o próximo, destinatário da graça divina.
São alarmantes os índices de agressões e assassinatos de homossexuais no Brasil. A urgência de uma lei contra a homofobia não se justifica apenas pela violência física sofrida por travestis, transexuais, lésbicas etc. Mais grave é a violência simbólica, que instaura procedimento social e fomenta a cultura da satanização.
A Igreja Católica já não condena homossexuais, mas impede que eles manifestem o seu amor por pessoas do mesmo sexo. Ora, todo amor não decorre de Deus? Não diz a Carta de João (I,7) que "quem ama conhece a Deus" (observe que João não diz que quem conhece a Deus ama...).Por que fingir ignorar que o amor exige união e querer que essa união permaneça à margem da lei? No matrimônio são os noivos os verdadeiros ministros. E não o padre, como muitos imaginam. Pode a teologia negar a essencial sacramentalidade da união de duas pessoas que se amam, ainda que do mesmo sexo?
Ora, direis, ouvir a Bíblia! Sim, no contexto patriarcal em que foi escrita seria estranho aprovar o homossexualismo. Mas muitas passagens o subtendem, como o amor entre Davi por Jônatas (I Samuel 18), o centurião romano interessado na cura de seu servo (Lucas 7) e os "eunucos de nascença" (Mateus 19). E a tomar a Bíblia literalmente, teríamos que passar ao fio da espada todos que professam crenças diferentes da nossa e odiar pai e mãe para verdadeiramente seguir a Jesus.
Há que passar da hermenêutica singularizadora para a hermenêutica pluralizadora. Ontem, a Igreja Católica acusava os judeus de assassinos de Jesus; condenava ao limbo crianças mortas sem batismo; considerava legítima a escravidão; e censurava o empréstimo a juros.Por que excluir casais homoafetivos de direitos civis e religiosos?
Pecado é aceitar os mecanismos de exclusão e selecionar seres humanos por fatores biológicos, raciais, étnicos ou sexuais. Todos são filhos amados por Deus. Todos têm como vocação essencial amar e ser amados. A lei é feita para a pessoa, insiste Jesus, e não a pessoa para a lei.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Acerca da crítica e da suspeita

A crítica é a substância própria do pensamento reflexivo. Ela consiste num salto qualitativo do sujeito em direção a um comum-pertencer no tocante à condição de ser e não-ser. Neste sentido, pode-se afirmar que o homem circula entre dois mundos que descrevem, respectivamente, o determinismo e a liberdade.

Porém, não se diga que o mundo humano é o mundo da perfeição moral, pois os hábitos e costumes prescrevem normas de conduta que consignam práticas que, historicamente, se cristalizaram e, consequentemente, subvencionaram discursos que intituiram signos e referências simbólicas que aprisionaram nossas portências mito-poéticas, escravizando as representações subjetivas no logocentrismo de uma linguagem viciada em categorias que, em última instância, nascem em ou decorrem para uma referência divina...




Entretanto, se a ideia transcêndental de Deus permite reunir a totalidade dos fenômenos do mundo em uma tipografia metafísica de uma fatasmagoria que, supostamente, é a eternidade criadora e, portanto, a causa incausada dos processos físicos e orgânicos em geral; a religião, assim como o Estado, a escola e a família são aparelhos ideológicos que alienam a consciência político-histórica das pessoas, em um contexto no qual todos somos reificados, fetichisados e transacionados como se mercadoria fôssemos...



Mas, afinal, o que é a consciência proprieamente dita, senão apenas um instante pouco revelado de instâncias mais profunda da psiquê humana, que, por sua vez, se estrutura em uma realidade adversa às suas regras ancenstrais, no interior de uma cultura que nos distancia, normativa e categoricamente, dos instintos, sem, contudo, possibilitar uma existência saudável, no tocante aos impulsos, desejos e paixões?... Ao que tudo indica, para nosso desespero, a cultura é o mundo da dor e do sofrimento, prioritariamente quando acreditamos e agimos de acordo com padrões que reprimem e disciplinam a poética verdadeiramente fundamental do eu.




Tudo isso para dizer que as cisões, as carências, as faltas e, também, a angústia e o desespero são o liame da crítica e da mobilização do pensamento em direção ao seu centro, que, relativamente à problematização de si mesmo, conduz, finalmente, à suspeição daquilo que se nos aparece como claro e distinto no raiar das significações. 

Destarte, como uma espécie de persistência dionisíaca ou, ainda, como uma espécie de esforço negativo para ficarmos sempre alerta contra a ideologização da consciência, emergem subliminaridades que nos escapam e que, talvez, sempre escaparão, pois estão tão enraizadas, quanto familiarizadas no modo de viver e na maneira de "dizer" o mundo. E, para não dizer que o senso comum não tem lá a sua sabedoria, ele mesmo percebe que "nem tudo é como a gente quer" e que "as aparências enganam"...